Você sabia que as árvores também podem nos contar histórias? Tudo isso porque as estruturas presentes na madeira armazenam importantes informações acerca das condições em que as árvores se desenvolvem. É possível, por meio da análise dos anéis de crescimento das árvores, obter informações sobre temperatura, chuvas, incêndios florestais, períodos de seca extrema, entre outras. A história que as árvores contam são destrinchadas pela dendrocronologia. Vamos entender um pouco mais sobre esse assunto?
Anéis de crescimento
Quando observamos um corte transversal de uma árvore, é possível notar que ela possui círculos concêntricos. Esses círculos são denominados como anéis de crescimento. Os anéis de crescimento são resultado de divisões celulares, mais precisamente da atividade do câmbio vascular.
Cada período de atividade cambial dá origem a uma camada de crescimento anual, ou seja, representa a quantidade de madeira formada em um ano. As camadas resultantes da atividade cambial aparecem em formas de anéis. Um anel de crescimento típico possui duas partes distintas:
- Lenho inicial ou primaveril: representa o crescimento que ocorre no início do período vegetativo, normalmente na primavera. Apresenta uma coloração mais clara.
- Lenho tardio ou outonal: representa o fim do período vegetativo, geralmente no outono. Pode apresentar uma coloração mais escura.
Fatores ambientais, bióticos e abióticos podem afetar o crescimento de uma árvore, como: competição entre indivíduos, água, luz, temperatura, nutrientes, poluentes, vento, fogo, entre outros.
A formação de um anel de crescimento típico é mais comum em árvores que crescem em locais com estações do ano bem definidas, como em regiões temperadas. Já em regiões tropicais e subtropicais, pode ocorrer os chamados falsos anéis anuais devido à sazonalidade climática.
A formação dos falsos anéis anuais pode estar associada a fatores ambientais, tais quais: mudanças abruptas na disponibilidade hídrica, presença solar, temperatura, entre outras. Essas alterações ambientais podem interferir na largura dos anéis, sendo esse parâmetro um indicativo relativamente preciso sobre a pluviosidade.
Quando uma árvore se desenvolve em condições favoráveis, ou seja, com períodos de chuva adequados, os anéis de crescimento são mais largos. Por outro lado, em condições mais drásticas, com períodos de seca, os anéis são mais estreitos.
Já as árvores que se desenvolvem em regiões de florestas tropicais pluviais, ou que apresentam atividade cambial contínua, pode haver ausência de anéis de crescimento. Com base nessas informações, muitas vezes se faz difícil avaliar a idade dessas árvores.
Quando o objetivo é estudar os efeitos das mudanças climáticas sobre as florestas tropicais, por exemplo, as informações registradas na madeira ao longo do crescimento das árvores, podem e devem ser utilizadas como um arquivo natural para se reconstruir climas passados.
É importante destacar que para realizar uma análise dendrocronológica, é necessário utilizar amostras de madeiras que apresentem anéis de crescimento com periodicidade conhecida.
Dendrocronologia
Etimologicamente, dendrocronologia vem do grego, “dendros”, que significa árvore, “cronos”, que expressa tempo e “logos” que quer dizer ciência. Em outras palavras, a dendrocronologia representa o ramo da ciência que se dedica ao estudo da datação dos anéis de crescimento.
A dendrocronologia é um método que permite fazer uma retrospectiva da história de uma árvore, bem como também de uma floresta. É possível reconstruir, por exemplo, o histórico de possíveis relações do clima com o crescimento, como também a ocorrência de perturbações, de origem antrópica ou não.
As primeiras associações entre a interferência das condições ambientais no desenvolvimento das árvores e na largura dos anéis de crescimento foram feitas por Leonardo da Vinci, no século XVI. A dendrocronologia começou a ser aplicada como ciência em 1901, pelo astrônomo americano A. E. Douglass.
Como obter os dados dendrocronológicos?
A etapa de obtenção de dados para os estudos dendrocronólogicos é fundamental para o seu êxito. Os dados podem ser obtidos por meio de amostras retiradas do tronco das árvores, podendo ser amostras obtidas de forma direta ou indireta.
Na análise do tronco direta ou completa, se faz necessário derrubar a árvore que será estudada. Da árvore abatida, é possível retirar discos em diferentes alturas, com a possibilidade de acompanhar a formação e delimitação dos anéis ao longo de todo disco. Dessa maneira, fica mais fácil identificar a formação de falsos anéis, pois em sua maioria não formam uma volta completa ao redor da medula.
Em se tratando da análise indireta ou parcial, uma das técnicas mais utilizadas é a da verrumagem, em que uma amostra de madeira é retirada do tronco da árvore utilizando-se um trado. Nessa análise, é possível observar a formação parcial dos anéis, ou seja, representa uma amostra do raio da árvore e não do seu diâmetro completo. Podem ser retiradas de 2 a 4 amostras de raio por árvore, geralmente à altura do peito (1,3 m do solo). A principal vantagem desse método é a retirada indireta da amostra, sem a necessidade de derrubada da árvore. Essa metodologia é ideal para aquelas árvores que são nativas ou de áreas protegidas.
Tanto a amostra completa, como parcial, precisa passar por um tratamento para que os anéis fiquem mais visíveis para coleta dos dados. Para tanto, precisam ser secas, lixadas e polidas, sequências que proporcionam maior clareza para a etapa seguinte, de visualização e marcação dos anéis.
A marcação dos anéis pode ser feita utilizando-se uma lupa ou estereoscópio. Para a correta delimitação dos anéis, é recomendado que se encontre padrões entre os anéis largos e estreitos. Após a delimitação dos anéis, é feita a mensuração da largura dos mesmos. Para tanto, são utilizados alguns softwares. Para amostras de discos, é indicado o uso do software TSAP-Win do LINTAB. Para amostras de raio, é indicado tanto o LINTAB, como o IPWin do Imagem Pro Plus.
Após a obtenção desses dados, é possível fazer o cruzamento com dados ambientais, por meio do software COFECHA.
Principais aplicações da dendrocronologia
As aplicações da dendrocronologia vão depender do objetivo pelo qual o estudo está sendo desenvolvido. Algumas aplicações da dendrocronologia são: dendroclimatologia, dendroecologia, dendrohidrologia, dendroarqueologia, dendroquímica, entre outras.
Para estudos que visam analisar as variações ambientais, é possível associar a cronologia da largura dos anéis de crescimento com eventos conhecidos, como por exemplo, série histórica pluviométrica. Após essa análise, são verificados padrões de variação dos anéis de crescimento e feita uma associação com eventos climáticos, como secas extremas.
Outra importante área de aplicação da dendrocronologia é no manejo florestal. Com as informações obtidas do passado das florestas, é possível traçar um planejamento mais preciso para ações futuras. Alguns trabalhos utilizam a dendrocronologia para avaliar o crescimento de espécies de florestas nativas, por exemplo.
Alguns pesquisadores também já observaram padrões nos anéis de crescimento que possibilitam diferenciar as variabilidades naturais do clima e a intensificação do aquecimento global pela ação humana. A dendrocronologia se apresenta, portanto, como uma importante ferramenta de análise de eventos passados para melhor compreensão dos padrões de aquecimento global.
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