Será mesmo que o Brasil tem áreas florestais protegidas além da conta? Vocês, assim como eu, estão curiosos para saber se o discurso que o Brasil preserva demais é verdade ou mito? Espero que sim!
Ranking dos países com maior cobertura florestal
Para começar a desvendar esta assunção, resolvi buscar com a FAO – Food and Agriculture Organization e a IUCN – International Union for Conservation of Nature quais os países do mundo inteirinho que têm maior cobertura florestal. Por que florestal? Porque os ecossistemas florestais são os maiores baús de alimento, habitat, recursos genéticos, biodiversidade e ativos econômicos do planeta. Por isso, vamos abordar nesse texto sobre as áreas protegidas no Brasil. Poderíamos também falar de conservação de áreas marinhas, mas isso dá assunto para um outro texto.
Segundo dados da FAO, 20,1% de toda a cobertura florestal mundial está na Rússia, que vem em primeiro lugar quando se trata de área florestada, seguida pelo Brasil, com 12,2%. O terceiro lugar fica com o Canadá, que tem 8,5% das florestas do mundo; o quarto, com os Estados Unidos, com 7,6% e em quinto vem a China, com 5,4%.
Não por acaso, os países com maior cobertura florestal são também aqueles com maior área territorial. Interessante ainda notar que países da Europa, que se desenvolveram economicamente em épocas anteriores a alguns dos países mencionados não figuram entre aqueles com grandes coberturas de florestas. Destaco por fim que, dentre os países citados acima, apenas o Brasil tem florestas tropicais, as quais apresentam uma diversidade de espécies muito maior do que a das florestas de clima temperado dos companheiros do Norte. Do açaí aos remédios, muito do que consumimos tem origem nas florestas brasileiras.
Com estas informações, busquei entender o quanto estes países preservam suas florestas. Para tanto, resolvi focar nas áreas protegidas de cada um, independente da forma de proteção, mas que tivessem como objetivo conservar ou preservar ecossistemas vegetacionais terrestres.
Vamos aos dados: 1,5% do território russo é ocupado por áreas naturais altamente protegidas chamadas Zapovedniks. São áreas super restritas desenhadas apenas para proteger os ecossistemas. Há mais de 5.000 pessoas trabalhando nos 103 zapovedniks, cujas responsabilidades são proteger e estudar as áreas, além de realizar atividades extensas de educação ambiental para a população e, principalmente, para as crianças nas escolas. Ademais, a Rússia tem 50 Parques Nacionais, em que, diferente dos zapovedniks, turismo e lazer são permitidos; 11 áreas chamadas natural World Heritage e alguns zakazniks. O país tem a meta de proteger 18% do seu território até 2025.
Já o nosso querido Brasil, tem 6% da sua área territorial coberta por Unidades de Conservação de Proteção Integral, que são nossas áreas mais protegidas, conforme disposto pela Lei n.º 9.985/00, conhecida como Lei do SNUC. No total, temos 777 UCs de Proteção Integral, cuja maior área recoberta está no Bioma Amazônico. Se considerarmos todos os tipos de UCs dispostos na mencionada norma, o percentual do território recoberto sobe para 18%, distribuídos em 2.446 unidades.
As áreas protegidas no Brasil
O Brasil tem ainda outros diversos tipos de áreas voltadas à proteção do meio ambiente natural, como Áreas de Preservação Permanente – APP, Reservas Legais – RL, etc. Há que se esclarecer, no entanto, que as únicas áreas que realmente garantem proteção legal às florestas são as UCs de Proteção Integral. Digo isto, pois, nos outros tipos de áreas não há garantias de que haja vegetação e ainda é possível que haja intervenções legais para atividades econômicas e moradia.
Todo este confuso e pouco eficiente regramento de proteção está disposto majoritariamente na mencionada Lei do SNUC e no Código Florestal, Lei n.º 12.651/12, bem como em seus decretos regulamentadores.
O Canadá, por sua vez, apresentava, em 2017, mais de 7.500 áreas protegidas que cobriam um total de 11,5% do território nacional. Hoje, é bem possível que este número seja maior, dado que é política do governo Canadense expandir suas áreas protegidas em terra e em mar. Em 2015, o Governo Canadense, tanto na esfera federal quanto nas províncias e territórios, lançou os Biodiversity Goals and Targets for Canada para 2020, em resposta à convenção da biodiversidade das Nações Unidas. Dentre os objetivos, está o de aumentar sua área territorial protegida para 17% da área do país.
E os EUA? Bom, os Estados Unidos têm a primeira Unidade de Conservação do mundo, o famoso Parque de Yellowstone, instituído em 1872 e que deu o start mundial na criação de áreas protegidas no modelo vigente. Além deste, o país tem mais de 36 mil áreas protegidas, que perfazem 12% do território estadunidense.
Abro um parêntese aqui para explicar que há um padrão mundial de categorização destas áreas protegidas, estabelecido pela IUCN e de adoção voluntária. O Brasil, por exemplo, não segue esta categorização. Sendo assim, a comparação direta entre os dados apresentados acima para os cinco países é bastante difícil por conta dos diferentes tipos de áreas protegidas em cada um. É possível, no entanto, traçar um perfil geral da proteção de áreas florestais nestes e entender como cada um vem lidando com a necessidade crescente de proteção dos remanescentes nativos.
Extensão de áreas protegidas no Brasil
Neste sentido, podemos dizer que o Brasil realmente não fica atrás em se tratando de extensão de áreas protegidas em seu território, apresentando percentuais maiores que os dos colegas de ranking. Dois pontos, porém, chamam atenção. Em primeiro lugar, o Brasil não busca alcançar nenhuma meta numérica de conservação ou preservação a partir de 2020; pelo contrário, o Ministério do Meio Ambiente tem tido muito sucesso em alcançar sua meta extraoficial de destruição das áreas de mata nativa do país. Isto fica claro pelos dados de aumento expressivo de desmatamento e queimadas no Brasil em 2019 e 2020 emitidos pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais – INPE. Fica claro também pela própria posição institucional do Ministério e por diversas falas dos ocupantes dos mais altos cargos da república.
Os dados do Instituto mostram um crescimento da área total desmatada na Amazônia Legal em 2019 e, maior ainda, em 2020. Sobre isto, o Professor da USP, Paulo Artaxo, comentou “O governo segue implementando sua política de desmantelamento das políticas ambientais e o resultado prático disso é o desmatamento da Amazônia”.
O segundo ponto que entendo ser de suma importância discutir é a efetiva proteção das áreas naturais no Brasil. Como mencionei, entendo que proteção efetiva podemos dizer que temos apenas nas Unidades de Conservação de Proteção Integral, que ainda assim sofrem pressões de atividades econômicas. Nas Unidades de Conservação da Amazônia, por exemplo, houve desmatamento de uma área de 1.100 km² só em 2019, um incremento de desflorestamento de 43% em relação ao ano anterior. Das 05 UCs com maiores índices de perda florestal, duas são Áreas de Proteção Ambiental – APA e outras duas são Reservas Extrativistas – RESEX, ambas do grupo de Uso Sustentável, conforme SNUC; apenas uma é Floresta Nacional, UC do grupo de Proteção Integral.
Inclusive existe o Índice de Efetividade de Gestão das Unidades de Conservação Federais, que é um indicador internacional relacionado aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável – ODS das Nações Unidas. Em sua última atualização, em 2016, o Brasil atingia menos de 50% de efetividade de gestão das UCs federais.
Em suma, não adianta criar Unidades de Conservação e, ao mesmo tempo, criar mecanismos institucionais e legais que minem o poder protetivo desta ferramenta. Assim, o Governo Brasileiro deveria se preocupar em gerir melhor suas áreas nativas e punir exemplarmente aqueles que desenvolvem atividades ilegais, seja dentro ou fora de Unidades de Conservação. Deveria também estabelecer metas numéricas para proteção do que resta de mata nativa antes que seja tarde. E não deveria se preocupar se protegem florestas demais (o que não fazemos), já que a atual situação ambiental mundial é insana!
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