A Ilustração Botânica têm marcado presença em decorações, roupas e até tatuagens, mas muitas pessoas não sabem o quão importante esta arte foi e ainda é para a ciência.
O que é Ilustração Botânica?
A ilustração botânica é um segmento da ilustração científica, voltada ao registro gráfico de espécies vegetais.
Para que serve?
Já nos primórdios da humanidade, o homem desenhava plantas nas paredes das cavernas, inicialmente, para armazenar o conhecimento de quais eram comestíveis, com o passar dos anos também para registrar o uso de espécies medicinais.
Além de poderem ser utilizadas para estudos de identificação ou classificação vegetal.
Atualmente, as ilustrações são muito utilizadas em artigos científicos, pois estes devem, como regra, descrever todos os detalhes da planta.
Em cada ilustração, deve detalhar o número exato de pétalas, sépalas, filetes, pecíolos, gemas, nós, entrenós, folhas, folíolos, entre muitas outras estruturas que fogem do conhecimento popular.
Logo, o ilustrador botânico, além de ter muita prática com desenho, deve ter vasto conhecimento em anatomia vegetal.
Há quem pergunte: “mas não é mais fácil tirar uma foto?” — De fato, hoje em dia as câmeras possuem grande qualidade de imagem. No entanto, com a ilustração é possível manter o foco em características específicas, além de poder, retratar detalhes mínimos que nem sempre são fáceis de serem postos em foco.
Simultaneamente, outro fator que afeta a fotografia é a luz, podendo alterar os tons naturais do indivíduo. Em contrapartida, na ilustração as cores devem necessariamente ser as mais próximas do real.
De fato, nem toda arte com botânica pode ser considerada uma ilustração, mas como são feitas com um rico preciosismo técnico, as pessoas tendem a encaixá-las em situações de rotina, fora do âmbito científico, principalmente pelo seu apreço visual.
As técnicas são muitas, mas vale apontar principalmente as prensas reproduzidas com aquarela, ou nanquim.
[…]Dependendo da sua finalidade a ilustração pode ser feita, basicamente, de três formas: utilizando somente o desenho (a lápis), o desenho finalizado a nanquim (bico-de-pena) ou a pintura geralmente aquarela. Nos dois primeiros casos, em monocromia, usando grafite (lápis) ou a pena e tinta, os elementos básicos do desenho -ponto e linha- são utilizados em todas as modalidades de registro, resolvendo formas, volumes e texturas. Já a pintura traz a vantagem da definição cromática do vegetal e de suas peças, como flores e frutos, facilitando enormemente o processo de reconhecimento do mesmo. […](CARNEIRO, 2011, p. 24)
Os primeiros desenhos
Como dito anteriormente, o ser humano desenhava plantas desde o período paleolítico. Contudo, alguns dos registros mais antigos conhecidos são os de Teofrasto, um filósofo da Grécia antiga, aprendiz de Aristóteles, que em 314 a.C., escreveu dois livros com ilustrações botânicas, Historia Plantarum e Causae Plantarum, que descreviam estruturas vegetais conhecidas na época, e o potencial delas para o homem.
Ainda mais, alguns anos a frente, Cratevus, um dos mais famosos botânicos do século I a.C, escreveu o livro Aniciai Iulianae Codex, obra na qual podemos encontrar várias ilustrações em pergaminhos.
Este livro foi bastante influente no estudo das plantas, tendo seu conteúdo restaurado e reproduzido inúmeras vezes.
Século XV, um marco para a botânica
Adiantando um pouco para o século XIII e XIV temos a criação dos primeiros jardins botânicos e herbários do mundo.
Fatos que, aliado ao Renascentismo (um período da história que influenciou fortemente o estudo científico) culminaram por atiçar a curiosidade dos cientistas pelo belo da flora.
Inclusive, a partir do século XV, a botânica tornando-se oficialmente uma cadeira de estudos em universidades europeias. Esse crescente interesse fomentou um novo mercado formado principalmente por inúmeras publicações botânicas.
Esses materiais continham ilustrações extremamente detalhadas que despertavam interesse de curiosos, principalmente quando se tratava de espécies exóticas que viriam de países distantes.
Entre esses curiosos, podemos citar o pintor Leonardo da Vinci, famoso por seu quadro “Mona Lisa”. Seus estudos sobre o tema contam com observações quase inimagináveis para seu tempo.
Marcos para a ilustração botânica
A primeira máquina de impressão surgiu por volta de 1439, uma invenção do alemão Johannes Gutenber (1398-1468).
Este equipamento foi muito importante para o mercado das edições botânicas, pois possibilitou que as imagens em publicações aparentassem uma maior qualidade.
Anteriormente essas imagens eram geradas por xilogravura (a matriz do desenho era feito em uma placa de madeira e era replicado como um “carimbo” em outras superfícies), e não havia homogeneidade nas publicações.
Apesar da possibilidade de ilustrações coloridas, era um consenso entre os cientistas que a cor era dispensável, pois tirava a atenção do que deveria ser evidenciado, no caso, as estruturas florais.
Contudo, alguns cientistas resolveram quebrar essas barreiras com o passar dos anos.
O início da taxonomia vegetal
Carolus Linnaeus, naturalista sueco (conhecido como Carlos Lineu), estudava durante horas as espécies vegetais que estavam expostas no jardim da Universidade de Uppala.
Em 1741, em seu amplo período de observações, o naturalista começou a notar padrões dentro do mundo vegetal. Esses anos de estudo lhe concederam o título do “Pai da Taxonomia Vegetal”, já que ele participou da criação da ciência que classifica e nomeia seres vivos. (Leia mais sobre a temática clicando aqui).
Os estudos do sueco destacam a classificação de órgãos reprodutores das plantas, e suas publicações continham até dissecação de frutos e flores.
Apesar dos preconceitos da época com ilustrações coloridas, Lineu convidou para ilustrar suas descobertas o pintor Georg Dionysus Ehret (1708-1770).
[…]Ehret teve que adaptar seu estilo de pintura decorativa para as orientações científicas ministradas pelo próprio Lineu, com as instruções tornou-se o ilustrador mais divulgador do sistema lineano. […] (SILVA, R. 2019 – pp. 823-835)
A partir desse momento que a ilustração botânica estreitou ainda mais seus laços com a arte.
[…]Conclui-se que a parceria entre a arte e ciência foi considerável para a formação do artista científico, na qual somou-se a habilidade de desenhista/pintor com a orientação e fundamentação teórica do naturalista botânico. […] (SILVA, R. 2019 – pp. 823-835)
A ilustração botânica hoje
A ilustração botânica sempre esteve diretamente ligada ao estudo da ciência, muitas dessas possuíam altíssima qualidade técnica, mesmo em tempos mais remotos.
Além disso, um ilustrador talentoso é considerado um profissional renomado, independente de qual período.
Hoje em dia, a ilustração botânica tem seu espaço reconhecido como disciplina curricular dentro das universidades ou em institutos de pesquisa.
A exemplo, na cidade de Curitiba, existe uma Instituição de ensino focado no tema, o Centro de Ilustração Botânica no Paraná (CIBP).
O Brasil também possui muita história nesta área. É inegável a importância de Margaret Mee, ilustradora botânica de grande influência no legado científico brasileiro. Cita-se Diana Carneiro, autora do livro “Ilustração Botânica: princípios e métodos”, como uma ótima fonte de aprendizado no assunto.
Um efeito secundário
Quando usadas como peça de decoração, as ilustrações botânicas chamam a atenção até das pessoas que não lidam com assuntos ambientais no dia a dia. Esse interesse pode se manifestar de várias formas e até trazer a curiosidade na botânica como objeto de estudo.
Ademais, trazendo cada dia mais, pessoas para o âmbito da preservação e conscientização ambiental.
Como se tornar um Ilustrador Botânico
Não é necessário ser formado em nenhuma faculdade para ser ilustrador botânico.
Porém, nem por isso significa que não haverá horas de estudo, tanto de botânica quanto das técnicas de ilustração em si, e, um monte de materiais para comprar.
Se você tiver interesse, primeiramente procure por possíveis cursos em sua cidade, inclusive em universidades, porém, há cursos online e livros instrutivos.
Uma pequena homenagem
Esse artigo é também uma homenagem a uma das melhores ilustradoras botânica, Rosane Quintella, que se destacava por ser uma grande amiga, assim como professora incrível.
A artista botânica estudou na Escola de Música e Belas Artes do Paraná, no campus de Curitiba, graduando-se em artes plásticas em 1982. Mais tarde, em 1992, graduou-se em biologia pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná e depois realizou um curso de especialização em ilustração em 2002.
Em 2005, ela foi a ganhadora do prêmio Margaret Mee em Ilustração Botânica no Kew Gardens, maior jardim botânico do mundo, localizado em Londres. Ao retornar ao Brasil, tornou-se então diretora do Centro de Ilustração Botânica do Paraná em Curitiba e ensinou ilustração botânica até 2019.
Rosane trabalhou em belíssimas aquarelas, bem como caneta e tinta para ilustrações técnicas. Ademais, o trabalho da artista está dentro das coleções do Kew Garden, incluindo a Galeria Shirley Sherwood. Faleceu em setembro de 2020 deixando alunos e família com muitas saudades.
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