No Brasil, chama-se Pacote Verde ou Pauta Verde o conjunto de processos relacionados a algumas políticas de proteção ao meio ambiente e ações sobre a crise climática. Em abril de 2022, os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) julgaram sete ações que compõem o Pacote Verde. A saber, nos anos 80, utilizou-se o mesmo termo em referência à estratégia de sustentação do Plano Cruzado, no Governo Sarney. Naquele contexto, o Pacote Verde se baseava na ideia de expansão da produção agrícola. Por consequência, esperava-se baixar os preços dos produtos e conseguir alimentar mais pessoas.
As ações que compõem o Pacote Verde
Arguição de Descumprimento de Princípios Fundamentais (ADPF) 760
Medida que aponta atos comissivos e omissivos do Ministério do Meio Ambiente (MMA), Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais (IBAMA), Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e da Fundação Nacional do Índio (FUNAI). Alega-se impedimento da execução de políticas aplicadas para o combate ao desmatamento na Amazônia Legal e à emergência climática. Dessa maneira, fere o Artigo 225 da Constituição Federal de 1988:
Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações (BRASIL, 1988).
Posto isto, a ação pede o retorno do Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal (PPCDAm).
Qual a importância do PPCDAm?
Criado em 2004, teve como objetivo reduzir o desmatamento e incentivar o modelo de desenvolvimento sustentável na Amazônia Legal. Para tanto, estruturou-se em torno de três eixos temáticos:
- I. Ordenamento fundiário e territorial;
- II. Monitoramento e controle ambiental;
- III. Fomento às atividades produtivas sustentáveis.
Entre 2004 e 2012, com a execução do plano, reduziu-se cerca de 83% nas taxas de desmatamento do Brasil. No entanto, em 2019, o plano foi suspenso pelo atual governo. Como resultado, os índices de desmatamento subiram.
Segundo dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), em 2021, as taxas de desmatamento na Amazônia Legal alcançaram 13.038,00 km². Contudo, tais dados refletem também nas emissões de Gases do Efeito Estufa. Durante a vigência do PPCDAm, o Brasil se tornou referência na redução de emissões de Gases do Efeito Estufa (GEE) por desmatamento de florestas tropicais. Porém, hoje, o país é considerado o principal emissor de GEE nesse setor. A saber, 8 das 10 cidades que mais emitem CO₂e no Brasil se localizam na região amazônica.
ADPF 735
Requerimento contra o Decreto Presidencial n.º 10.341/2020, que transfere do Ibama e do ICMBio para as Forças Armadas o poder em realizar ações preventivas e repressivas contra o desmatamento ilegal e combate a focos de incêndio. Como Garantia da Lei e da Ordem (GLO), o decreto foi válido entre o período de 11 de maio de 2020 a 20 de abril de 2021. No momento do decreto, a ação foi considerada perigosa para a autonomia dos órgãos ambientais e desrespeitosa com os servidores. Além disso, evidenciou indícios de corrupção sobre os processos de licenciamento.
ADPF 651
Considera os Decretos presidenciais n.º 10.224/2020, 10.239/2020 e 10.223/2020 como inconstitucionais. Justifica-se pela exclusão da sociedade civil do Conselho Deliberativo do Fundo Nacional do Meio Ambiente por meio do decreto 10.224. Antes, contava-se com uma representação de cada região do Brasil e com uma indicação de representação do CONAMA (Conselho Nacional do Meio Ambiente). Portanto, com a exclusão, cria-se brecha para fragilização da democracia participativa e centraliza as decisões de políticas públicas ambientais ao Poder Executivo.
Já o decreto 10.239 exclui a participação dos governadores do Conselho Nacional da Amazônia Legal. Além disso, retirou o comando do MMA, passando-o à Vice-Presidência. Incluiu-se também os ministros do governo federal, compostos majoritariamente por Coronéis. Dessa forma, nenhum representante indígena, quilombola, moradores da região ou dos órgãos ambientais participam do Conselho.
Ainda, o decreto 10.223 extinguiu o Comitê Orientador do Fundo Amazônia (COFA). O Fundo foi criado em 2008 a fim de captar recursos para projetos de conservação da Amazônia. Nesse sentido, o COFA tinha como objetivo estabelecer diretrizes e critérios para aplicação dos recursos e acompanhar seus resultados. Com o seu fim, nota-se uma tentativa de desestruturação da governança do Fundo Amazônia.
Diante desses três decretos, por consequência, o combate ao desmatamento foi enfraquecido, impactando negativamente o bioma e as comunidades tradicionais.
Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO) 54
Em consonância com a ADPF 760, aponta omissão no combate ao desmatamento por parte do governo. Para tanto, apresentou-se dados sobre o desmatamento da Amazônia, extinção de instâncias governamentais e órgãos de combate aos crimes ambientais, diminuição nas fiscalizações do Ibama e paralisação do Fundo Amazônia.
ADO 59
Solicita a reativação do Fundo Amazônia, o repasse da verba para projetos já aprovados, além da continuação de análise dos projetos em consulta. Em consonância com a ADPF 651, apontou-se a extinção do COFA e, ainda, do Comitê Técnico do Fundo Amazônia (CTFA). Ademais, alegou-se a paralisação de R$ 1,5 bilhão e o bloqueio de atividades, mesmo com o aumento do desmatamento.
Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 6148
Aponta a inconstitucionalidade da Resolução CONAMA n.º 491/2018, que apresenta novos padrões de qualidade do ar. No entanto, a resolução não apresenta limites admissíveis para a qualidade do ar, nem mesmo estipula prazos para alcançar padrões de qualidade mais restritos. Dessa maneira, trata-se sobre parâmetros de qualidade do ar em níveis críticos, sem apresentar ambição em diminuir os níveis de poluição atmosférica. Ressalta-se que os níveis da qualidade do ar são importantes pela pauta climática, mas, também, por questões de saúde pública. Nesse sentido, de acordo com Raposo Junior, Norton e Assis (2021), a Resolução n.º 491 oferece “uma falsa sensação de proteção a sociedade”.
ADI 6808
Contesta a Lei n.º 14.195/2021, antes Medida Provisória 1.040/2021, que facilita a abertura de empresas com licenciamento ambiental emitido automaticamente para atividades de médio risco. Isso significa que qualquer pessoa que preencher o questionário de auto licenciamento pela internet, o consegue. A princípio, o objetivo da MP, conforme Kruse e Cunha (2022), era de “modernizar o ambiente de negócios no Brasil” e incluí-lo entre os 50 maiores países pertencentes ao Doing Business – projeto do Banco Mundial. Mas, a que custo?
Decisões do STF sobre o Pacote Verde
Em abril, a Corte deu início aos julgamentos. Iniciou-se com os processos ADPF 760 e a ADO 59, em conjunto. A ministra do STF, Cármen Lúcia, concluiu que os dados apresentados estavam em nível grave de inconformidade com a Constituição Federal. Solicitou-se, ainda, a apresentação de um plano de redução de desmatamento com prazo de 60 dias. No entanto, o ministro André Mendonça pediu vistas e o julgamento foi suspenso.
Ao final de abril, retomaram os julgamentos. Primeiramente, acolheu-se a APDF 651, onde se reconheceu a inconstitucionalidade de restringir o perfil dos participantes no Conselho Deliberativo do Fundo Nacional do Meio Ambiente, excluindo a participação popular das tomadas de decisões, e no Conselho Nacional da Amazônia Legal, excluindo os governadores. Também declarou a extinção do COFA como inconstitucional.
Em seguida, acolheu-se a ADI 6808, declarando o artigo 6º como parcialmente inconstitucional e acatando a exclusão do auto licenciamento ambiental das empresas. Com isso, o licenciamento ambiental deve seguir os procedimentos da legislação ambiental vigente. Ainda, anula as licenças adquiridas de maneira automática.
Em relação a ADI 6148 não houve declaração de inconstitucionalidade. No entanto, determinou-se que o CONAMA deve editar a resolução 491/2018, em um prazo de 24 meses, considerando:
“(i) as atuais orientações da Organização Mundial da Saúde sobre os padrões adequados da qualidade do ar;
(ii) a realidade nacional e as peculiaridades locais; bem como
(iii) os primados da livre iniciativa, do desenvolvimento social, da redução da pobreza e da promoção da saúde pública” (STF, 2022).
Os processos ADPF 735 e ADO 59 ainda não foram julgados. De qualquer forma, espera-se retornos semelhantes aos demais componentes do Pacote Verde – ou seja, como favoráveis ao meio ambiente.
Imponência do Pacote Verde
Diante do cenário de enfraquecimento da legislação ambiental, a tramitação dos processos componentes do Pacote Verde se torna uma ponta de esperança sobre a temática. Além disso, coloca-se como uma resposta ao retrocesso socioambiental – que mata floresta, exclui pessoas, não se preocupa com os povos da região. Vale ressaltar que estes não são os únicos prejudicados. A natureza deve ser vista como casa comum. Nesse sentido, a floresta caída no norte, também seca a vida no sul.
Como cidadãos possuidores do direito constitucional ao meio ambiente equilibrado, devemos acompanhar a continuidade do julgamento do Pacote Verde. Ainda, atentar-nos às propostas de leis realizadas. Do contrário, não haverá garantia de segurança ambiental e os prejuízos podem ser inúmeros.
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