Quando eu ainda estava na Universidade Federal de Sergipe, a UFS (fala ufisss e isso sempre será dos sergipanos, ok, UFES?), tinha um Prof. excelente chamado Robério que ministrava as disciplinas sobre recuperação de áreas degradadas, viveiros, etc. Todas as suas provas consistiam no mesmo: fale tudo que você sabe sobre “insira aqui o tema da disciplina”. Eu gastava dez laudas e ainda assim não conseguia nota máxima!
Bem, este texto é inspirado na minha época de aulas de Robério e eu vou escrever tudo que couber sobre Estudo de Impacto Ambiental – EIA e seu respectivo relatório – RIMA. Não se preocupem, que eu vou me resumir a explanar este assunto em 1500 palavras no máximo. Espero, ainda assim, ficar à altura de Robério.
É importante pontuar, a priori, que o Estudo de Impacto Ambiental é uma forma de apresentação de Avaliação de Impacto Ambiental – AIA, esta que é um instrumento promulgado em 1981 a partir da publicação da Política Nacional de Meio Ambiente – PNMA, Lei n.º 6.938 (art. 9, inciso III). A CONAMA n.º 01/86, que veio justamente para esclarecer sobre a aplicação da AIA, estabelece definições, responsabilidades, critérios e diretrizes gerais para implementação da Avaliação de Impacto Ambiental como um dos instrumentos da PNMA. Logo no art. 2º desta Resolução é apresentado o EIA como a ferramenta de AIA, indicando quais tipos de empreendimento são passíveis de licenciamento baseado neste documento.
Trago uma questão já abordada por mim neste blog, mas que merece se reiterada: os Estados e Municípios não podem aplicar normas que dispensem a apresentação de EIA/RIMA para o licenciamento ambiental dos empreendimentos elencados no art. 2º da CONAMA 01/86. Decisão tomada mais de uma vez pelo Supremo Tribunal Federal[1] e condizente com o sistema de proteção legal ambiental brasileiro, em que o ente Federal dispõe as diretrizes gerais que não podem ser minimizadas pelos demais entes.
Superado isto, vamos ao segundo ponto superimportante sobre o EIA: ele é um estudo PRÉVIO. Não é o tipo que cabe quando o empreendimento está em instalação, instalado ou em operação. Isto fica claro na leitura do art. 5º, inciso I desta CONAMA. Inclusive escrevi sobre o assunto no meu texto de estreia aqui no blog.
Este mesmo art., o 5º, traz as diretrizes gerais do EIA, enquanto o 6º define seu conteúdo mínimo. Por isso, eu vou utilizá-los neste texto para destrinchar de forma linear tudo que eu sei sobre o tema. Ressalto, antes de iniciar, que é comum órgãos licenciadores disponibilizarem termos de referência com todo o escopo mínimo de EIA/RIMA em suas páginas eletrônicas[2].
O inciso I do art. 5º da mencionada CONAMA traz a obrigação de indicação de alternativas técnicas e locacionais do empreendimento que se pretende instalar. Na vida real, é comum o empreendedor escolher a localização do empreendimento, bem como as técnicas a serem empregadas com base apenas em questões econômicas antes mesmo de contratar o EIA e, quando a equipe técnica vai realizar o estudo, tem que fazer mágica. É imprescindível para um EIA bem feito que haja uma boa avaliação das alternativas, que deve concluir pela escolha de umas delas, prezando por aquela com o menor impacto socioambiental. Sim, não se dá o mesmo peso para as questões socioambientais e as econômicas nesta escolha, porque precisamos lembrar do art. 225 da Constituição Federal de 1988. Temos que entender que o gasto maior para manter o meio ambiente equilibrado e sadio é o ônus do negócio que deve ser internalizado pelo empreendedor e não pela sociedade para que este economize, afinal o lucro será apenas dele.
A seguir, no inciso II do art. 5º, tem-se a exigência de Identificação e avaliação sistemática de impactos ambientais e a única dica que dou aqui é: conte com profissionais de áreas diversificadas e não tenha medo de indicar os aspectos e impactos ambientais[1]. É melhor entregar um EIA completo do que sofrer com diversos pedidos de correção quando da análise por parte do órgão ambiental.
O inciso III do mesmo art. traz a necessidade de definir áreas que nortearão a coleta de dados e a caracterização do empreendimento no EIA. Estas são três: a área diretamente afetada – ADA; a área de influência direta – AID; e a área de influência indireta – AII. A ADA é basicamente a área em que haverá atividade; numa mineração, por exemplo, é a área da mina, das estradas, das unidades de tratamento, área administrativa, etc. A AID é aquela que sofrerá de forma direta os impactos da atividade, por exemplo, área que receberá emissão de poeiras e ruídos, trechos de rodovias que sofrerão com aumento do tráfego, etc. Por fim, a AII é aquela que sofrerá os impactos de forma direta e indireta do empreendimento (neste sentido, a ADA e AID estão inseridas na AII); considera-se, por exemplo, que o município que receberá o empreendimento deverá apresentar aumento na geração de renda da sua população e isso é um impacto indireto da operação.
Seguindo o roteiro da norma, no art. 6º inciso I apresenta-se o ponto inicial do EIA, que é o diagnóstico ambiental. Este consiste no levantamento de dados primários e secundários sobre os meios físico, biótico e socioeconômico da ADA, AID e AII do empreendimento. Atenção! Pode haver diferentes áreas de influência para cada estudo de meio. Como assim? Digo: a AID para o meio biótico, que é fauna e flora, normalmente é diferente da AID para o meio socioeconômico simplesmente porque os impactos atingem estes meios de formas diferentes e o impacto direto na flora pode ser indireto na população, por exemplo.
O diagnóstico do estudo prévio de impacto é a base de tudo e, antes de executá-lo, é imprescindível estar certo sobre as áreas de influência da atividade, para que não haja gastos a mais em áreas de influência superinfladas e dados a menos naquelas que não abarcam toda a área realmente sob impacto, o que gerará necessidade de retificação.
O inciso II do art. 6º versa sobre a análise dos impactos ambientais do projeto e de suas alternativas, o que é o cerne de um EIA. Aqui, a norma indica ser necessário identificar os impactos e prever suas magnitudes, apontando os prováveis impactos relevantes. Acrescenta ainda que deverão ser apontados sobre os impactos identificados, se estes são positivos ou negativos, diretos ou indiretos, imediatos ou a médio e longo prazos, temporários ou permanentes; reversíveis ou irreversíveis, com propriedades cumulativas ou sinérgicas; e a distribuição de seus ônus e benefícios sociais. Há na literatura técnica, muitos modelos de apresentação da análise de impactos; eu sugiro sempre que o empreendedor uma ferramentas, como matrizes e mapas, pensando em tornar claríssima esta análise e diminuir consideravelmente os esclarecimentos que poderão ser requisitados durante o processo de licenciamento. Um dos grandes autores a consultar sobre o tema é o Luis Enrique Sánchez da Universidade Federal de São Paulo – USP.
O inciso III indica que sejam dispostas no EIA todas as medidas que o empreendedor pretende implantar para diminuir os efeitos negativos de alguns aspectos de sua atividade e ainda que estas medidas sejam explicadas e analisadas do ponto de vista da eficiência. Uma forma simples de entender é pensar nos efluentes gerados na área administrativa da atividade e em como isto será manejado. Se numa área sem acesso à rede de esgoto, indicar-se-á no EIA como este efluente será coletado, tratado e dispensado de modo a cumprir com a legislação e não causar poluição.
Por fim, temos o inciso lV que traz a necessidade de elaboração de programa de acompanhamento e monitoramento dos impactos positivos e negativos, indicando os fatores e parâmetros a serem considerados. Este tópico é o prelúdio trazido no EIA para o próximo documento a ser apresentado ao órgão ambiental no âmbito do licenciamento que é o Plano de Controle Ambiental – PCA. São os planos e programas que deverão ser implantados no empreendimento para executar a mitigação dos impactos negativos e para permitir a fluência dos impactos positivos.
Na CONAMA 01/86, em apreço, há ainda a definição de que o EIA deverá ser realizado por equipe multidisciplinar habilitada (com competências legais para a atividade que desenvolverão de acordo com sua formação e com os conselhos profissionais) que será responsável tecnicamente pelos resultados apresentados, podendo ser responsabilizada administrativa, civil e penalmente por aquilo que dispuserem no estudo.
Para finalizar, explico que o RIMA é um resumão do EIA e deve trazer as conclusões deste estudo de forma clara e simples para que qualquer pessoa seja capaz de entender. É um relatório mais “palatável” à sociedade em geral.
E é este o pequeno roteiro com pontos a se observar em qualquer EIA/RIMA.
[1] https://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=451655&ori=1
[2] Veja os TRs disponibilizados pelo governo mineiro: http://www.meioambiente.mg.gov.br/imprensa/noticias/1167-termos-de-referencia-para-elaboracao-de-estudo-de-impactorelatorio-de-impacto-ambiental-eiarima
[3] Aspectos ambientais: é tudo aquilo da instalação e operação do empreendimento que poderá gerar impactos positivos ou negativos ao meio ambiente. Já impactos são a consequência da instalação e operação do empreendimento. Por exemplo, a supressão de vegetação pode ser um aspecto da instalação do empreendimento, cujos impactos são perda de biodiversidade, fragmentação de habitat, alteração do microclima, etc.
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