O Brasil é um país rico em biodiversidade devido à fatores, como: clima e a grande extensão territorial. Isso faz com que possua uma vasta variedade de fauna e flora, fazendo com que o nosso país seja um lugar de grande variedade de espécies endêmicas, visto que as espécies de plantas e animais não estão distribuídas sobre a Terra de forma aleatória. Elas vivem nos lugares com condições físicas adequadas para a sua sobrevivência e reprodução, onde elas se adaptaram e co-evoluíram com outros organismos e o componente abiótico em complexas relações ecológicas. Entretanto, elas não estão distribuídas por todos os lugares com condições ecológicas suficientes para sua vida. A maioria vive em áreas relativamente pequenas, restritas a um único continente.
O oposto de endemismo é o cosmopolitanismo, condição na qual uma espécie é amplamente distribuída pelo mundo, o que é bastante raro, já que a maioria das espécies está restrita a uma região geográfica, seja ela ampla ou não. Uma espécie pode ser endêmica a um continente, a um país, a uma ilha ou a qualquer outra região específica. Quanto maior for o grau de especificidade do ambiente, maior o grau de endemismo.
Os endemismos ocorrem em áreas de alguma forma isoladas e resultam da separação de populações de uma dada espécie, que deixam de se cruzar e, continuando a reproduzir-se, evoluem separadamente. Neste processo, podem mesmo vir a dar origem a espécies distintas. Assim, os endemismos são o produto final da atuação de mecanismos de isolamento, que podem ser geográficos (como por exemplo alterações do nível das águas do mar, formação de cadeias montanhosas) ou comportamentais (por exemplo populações que apresentam épocas de acasalamento ou padrões de acasalamento distintos). A isto chamamos área de endemismo (AE): uma área onde houve restrição espacial de parte de uma biota causada por um processo comum de isolamento.
A ocorrência de endemismos depende por isso da mobilidade dos organismos e como tal, verifica-se em número mais elevado nos grupos de mobilidade mais restrita, como as plantas ou os peixes de água doce, do que nas aves ou mamíferos.
As espécies que ocorrem numa área muito restrita são encaradas de forma particular. A sua vulnerabilidade quase intrínseca, torna-as uma referência obrigatória quando se traçam linhas de ação para conservar a biodiversidade.
Os biomas brasileiros são exemplos de regiões com grau de endemismo. Cada qual apresenta inúmeras espécies que só podem ser encontradas nestes lugares, por exemplo: o jacaré do papo amarelo, mico-leão-dourado, algumas espécies de bromélias são endêmicas do bioma mata atlântica, já o beija-flor-de-gravata, rabo-mole-da-serra, e a gralha são específicos do bioma cerrado, Mandacaru e xique-xique do bioma pantanal, entre vários outros.
Vários centros de endemismo já foram identificados nos principais ecossistemas do Brasil. Somente na Amazônia, foram identificados 13 centros de endemismos para lepidópteros e 6 para vertebrados terrestres.
Os endemismos podem ser classificados de diversas formas, vejamos abaixo algumas delas:
- Quanto à sua origem, os endemismos podem ser classificados como autóctones ou alóctones. Os organismos endêmicos autóctones são aqueles cuja diferenciação ocorreu no local onde vivem no presente, enquanto os alóctones são aqueles que se diferenciaram num local diferente de onde ocorrem hoje.
- Relictos taxonômicos ou biogeográficos são tipos de endemismo alóctone. Os relictos taxonômicos são os únicos sobreviventes de grupos taxonômicos anteriormente diversos, enquanto os relictos biogeográficos são os descendentes estritamente endêmicos de um grupo que era amplamente distribuído no passado. Frequentemente essas classificações podem coincidir.
- Quanto à idade, espécies endêmicas podem ser classificadas como paleoendêmicas, no caso de espécies bastante disseminadas em épocas remotas persistirem numa área restrita, ou neoendêmicas, no caso de espécies formadas recentemente.
As Áreas de endemismo foram tradicionalmente consideradas como unidades básicas da Biogeografia Histórica. Elas seriam pontos de partida para diversos estudos de relacionamento histórico entre áreas, como na Biogeografia Cladística, e servem como importante regionalização biogeográfica. Por isso, são consideradas importantes para os esforços em conservação, já que a escolha de áreas prioritárias para preservação da natureza deve incluir aspectos históricos de evolução biogeográfica e um grande número de espécies endêmicas.
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Métodos utilizados para identificar áreas de endemismo no Brasil
Dois métodos foram utilizados para identificar áreas de endemismo no Brasil: o método tradicional de sobreposição de mapas individuais de espécies (MÜLLER, 1973) e o método proposto por Morrone (1994). O método tradicional consiste em sobrepor os mapas das espécies que possuem distribuições relativamente menores em comparação a área de estudo e identificar aquelas áreas que podem ser identificadas pela congruência total ou quase total nas distribuições de duas ou mais espécies (espécies homopátridas).
Morrone (1994) propôs um método para identificar áreas de endemismo baseadas na análise de parsimônia da distribuição das espécies (Parsimony Analyses of Endemicity).
O método consiste das seguintes etapas:
- Identificar as unidades geográficas operacionais (UGOs) de análise, que podem ser localidades, quadrículas com tamanho fixo ou regiões definidas com base em critérios físicos;
- Construir uma matriz de dados l x c, onde l (linhas) representam as UGOs e c (colunas) as espécies. Insere-se “1” se a espécie está presente e “0” se a espécie está ausente. Uma área hipotética codificada com zeros se emprega para determinar a raiz do cladograma;analisar a matriz utilizando um programa de análise de parcimônia (como por exemplo: Hennig 66, PAUP e NONA);
- Delimitar os grupos de UGOs definidas por pelo menos duas espécies;
- Sobrepor as distribuições das espécies que definem cada um destes agrupamentos sobre o mapa a fim de delinear os limites de cada área de endemismo. Este método permite obter agrupamentos hierárquicos das UGOs, que eventualmente podem ser classificados e nomeados como unidades biogeográficas distintas.
Um exemplo da aplicação do método de Morrone em um bioma brasileiro foi apresentado por Silva et al. (2004).
Mais recentemente, com o avanço nos programas de análise espacial, outros métodos biogeográficos para a detecção e análise de endemismo têm surgido (CRISP et al., 2001; LINDER, 2001; SZUMIK et al., 2002; LAFFAN & CRISP, 2003). Estas novas abordagens, além da detecção do endemismo, se propõem a quantificá-lo, analisá-lo em diferentes escalas espaciais, e avaliar incertezas na delimitação de áreas através de procedimentos estatísticos.
Contudo, sua aplicação geralmente depende de um conhecimento refinado das áreas de ocupação dos organismos em estudo, sendo, portanto, infactível para algumas áreas onde o conhecimento básico de distribuições ainda é precário.
Referência Bibliográfica
- CRISP, M. D.; S. W. LAFFAN; H. P. LINDER & A. MONRO. 2001. Endemism in the Australian flora. JOURNAL OF BIOGEOGRAPHY (28): 183-198.
- LAFFAN, S. W. & M. D. CRISP. 2003. Assessing endemism at multiple spatial scales, with an example from the Australian vascular flora. JOURNAL OF BIOGEOGRAPHY (30): 511- 520.
- LINDER, H. P. 2001. Plant diversity and endemism in sub-Saharan tropical Africa. JOURNAL OF BIOGEOGRAPHY (28): 169-182.
- MORRONE, J. J. 1994. On the identification of areas of endemism. SYSTEMATIC BIOLOGY (43): 438-441.
- MULLER, P. 1973. Dispersal centers of terrestrial vertebrates in the Neotropical. BIOGEOGRAPHICA (2): 1-244.
- SILVA, J. M. C.; M. C. SOUSA & C. M. M. CASTELLETTI. 2004. Areas of endemism for passerine birds in the Atlantic Forest, South America. GLOBAL ECOLOGY AND BIOGEOGRAPHY (13): 85-92.
- SZUMIK, C. A.; F. CUEZZO; P. A. GOLOBOFF & A. E. CHALUP. 2002. An optimality criterion to determine areas of endemism. SYSTEMATIC BIOLOGY (51): 806-816.
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