Nos últimos dias, o assunto que está na boca de todos que atuam na área ambiental, é o projeto da Nova Lei Geral do Licenciamento Ambiental, relatada pelo deputado Kim Kataguiri (DEM-SP), que surpreendeu com um texto que, em vez de trazer segurança jurídica, afrouxou as regras.
O tema é tão polêmico que se arrasta na Câmara há 15 anos. Na discussão de um marco legal para o licenciamento ambiental, a ideia era ouvir ambientalistas, ruralistas e órgãos de fiscalização.
Entre as críticas, estão a dispensa de licenciamento para algumas atividades ou empreendimentos como serviços e obras direcionados à melhoria, modernização e manutenção de infraestrutura de transportes em instalações pré-existentes; a dispensa de licenciamento para atividades agropecuárias – o texto diz que a validade da inscrição no cadastro ambiental rural já é considerada licença ambiental -; a extinção da responsabilidade de instituições financeiras por dano ambiental – apresentação de licença é considerada suficiente para a comprovação da regularidade, não cabendo responsabilização das instituições e entidades por danos ambientais causados pelos empreendimentos financiados.
Organizações socioambientais criticam a proposta e afirmam que o tema deveria ser discutido em audiências públicas na Câmara, antes de ser submetido ao plenário.
É certo que o licenciamento ambiental é um dos principais instrumentos de proteção ambiental que o Brasil tem hoje no seu arcabouço legal. E também é certo que o instrumento ainda precisa de muitos avanços para cumprir com sua função de forma mais eficiente e democrática. Mas o texto em discussão, ainda está recheado de retrocessos e torna o licenciamento ambiental um instrumento incapaz de gerar a proteção ambiental.
As principais críticas
Muitas das discussões envolvem principalmente a questão do licenciamento de estradas. Porém, a que tudo indica novas estradas ou ampliação de capacidade de estradas existentes continuariam exigindo o licenciamento e a dispensa de licenciamento ambiental será apenas para obras de manutenção, melhoria e modernização de estradas já existentes.
O projeto de lei também reduz os prazos para que os órgãos ambientais, como Ibama e secretarias municipais e estaduais de meio ambiente, liberem suas licenças.
Na área do agronegócio, passa a permitir que o Cadastro Ambiental Rural (CAR), feito pelos próprios produtores, tenha valor de licença ambiental. Para quem trabalha na área, é fácil perceber que o Licenciamento e o CAR não se equivalem, já que o CAR é apenas um cadastro, que não faz nenhum estudo mais aprofundado das consequências ambientais que este tipo de empreendimento pode causar.
As mudanças propostas também retiram o poder vinculante de instituições como a Funai e Fundação Palmares, que trabalham com comunidades indígenas e quilombolas. Hoje, esses órgãos podem vetar a concessão de licenças ambientais. Se o projeto de lei avançar do modo como está, elas perderão essa participação. Também terão a participação restringida o ICMBio e o Iphan, responsáveis pela gestão de unidades de conservação e patrimônio histórico.
O que está em jogo com a nova lei geral de licenciamento ambiental?
O licenciamento ambiental é um tipo de ferramenta de gestão pública que permite a localização, instalação, ampliação e operação de empreendimentos e atividades, como a construção de estradas e hidrelétricas. Quem dá essa licença são órgãos ambientais estaduais ou o próprio Ibama, quando se trata de grandes projetos.
O processo de licenciamento é dividido basicamente em três etapas: licença prévia (solicitada na fase de planejamento), licença de instalação (detalhamento do projeto de construção) e licença de operação (autoriza o início das atividades).
A nova proposta pretende acelerar esse processo, estabelecendo prazos para cada etapa do licenciamento. O problema é que o efeito pode ser o inverso do que se pretende. Por exemplo, ao invés de acelerar a emissão de licenças, a falta de condições institucionais dos órgãos ambientais pode resultar no indeferimento de licenças. É fato que o relator sabe das limitações dos órgãos, pois chegou a declarar que ‘’É uma oportunidade de que todos os órgãos manifestem suas deficiências e que elas sejam endereçadas pelo poder Executivo competente”.
Considerações finais
O licenciamento ambiental não é uma mera burocracia a ser eliminada, como querem convencer os brasileiros e brasileiras. Ele é um instrumento que existe para evitar, reduzir ou compensar os danos e riscos que uma obra ou atividade poluidora poderá causar ao ambiente e à população.
Ele deve ser um processo ético, transparente, com participação pública, e fundamentado nos princípios da prevenção e da precaução. É no licenciamento ambiental que o poder público atua para evitar que o hospital da cidade contamine a água que chega na sua torneira, evita que uma fábrica intoxique a população, que se avalia se o desvio de água do rio não trará prejuízo para a pesca ou para o abastecimento de água de uma cidade, ou se a barragem de rejeito de mineração tem risco de rompimento e quais as medidas de segurança que a empresa está adotando.
Também é durante o licenciamento ambiental que acontecem as audiências públicas para consultar as comunidades que poderão ser afetadas por algum projeto. Na maioria das vezes, esse é o único momento em que as pessoas podem opinar sobre uma obra que vai chegar e mudar toda sua vida.
Vamos aguardar os próximos capítulos desta discussão.
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