As florestas são importantes sumidouros de carbono atmosférico e seus depósitos carbônicos são fundamentais para garantir o ciclo global desse elemento. Assim, no contexto das mudanças climáticas, o desenvolvimento e a permanência das florestas são um dos principais meios para reduzir os efeitos drásticos das modificações antrópicas no clima.
Nas regiões tropicais, as florestas apresentam taxas de crescimento muito mais intensas, e com isso, o processo de estocagem de carbono é muito mais acelerado. É importante salientar que, florestas mais jovens, isto é, em estágio iniciais de sucessão, crescem muito mais rápido que florestas mais maduras, pois a competição pelos recursos ainda é muito baixa. Em contrapartida, à medida que as florestas crescem e amadurecem, o estoque de carbono, ou seja, o carbono armazenado na biomassa das árvores e de outras plantas, aumenta. Este incremento do estoque tende a se estabilizar em algum momento do estágio avançado de desenvolvimento da floresta. Assim, conforme o estoque de carbono aumenta, o processo de estocagem diminui, pois, o crescimento das árvores vai ser limitado pela competição e disponibilidade de recursos.
No Brasil, as áreas de floresta da Amazônia são as maiores detentoras de carbono estocado, com regiões apresentando algumas centenas de toneladas de carbono acumulado por hectare. A Mata Atlântica também é um bioma importante nesse processo, comportando o segundo maior estoque médio.
Entender a distribuição desses estoques nas diferentes áreas florestais e nas diferentes idades da floresta é uma tarefa complexa e que pode demandar um alto custo financeiro e metodológico. Porém, a geração de estimativas de carbono são fundamentais para manejar as florestas da Mata Atlântica, priorizando as áreas para conservação, visando não comprometer os estoques de carbono.
O Sensoriamento Remoto e a Modelagem de Carbono
Dados de sensoriamento remoto são relacionados com diferentes aspectos florestais, e amplamente utilizados para modelá-los. A saber, desde meados da década de 1980, realiza-se, com sucesso, o inventário do estoque de carbono florestal com o uso de dados de sensoriamento remoto. Desde então, diversas pesquisas vêm aportando melhorias significativas às técnicas de predição baseadas em sensoriamento remoto. Estes aprimoramentos tecnológicos têm permitido o desenvolvimento de diferentes sensores remotos, que viabilizam a contabilização precisa dos estoques florestais, em escalas cada vez maiores.
Sensores Passivos
Também conhecidos como sensores imageadores, ou seja, formam imagens (variáveis ópticas), são o tipo mais frequente de sensores remotos. Em síntese, o seu funcionamento é semelhante ao de uma câmera fotográfica, pois captam a energia eletromagnética (luz) refletida pelos diferentes alvos/objetos terrestres. Tendo em vista que, a depender das características dos alvos, as porções do espectro eletromagnético que serão absorvidas ou refletidas são diferentes, estes sensores particionam o espectro, capturando a luz em diferentes partes ou bandas.
Tipos de sensores
Os sensores podem ser categorizados, segundo sua resolução espectral, em:
- Multiespectrais – captam a luz em algumas bandas espectrais, geralmente nas porções azul, verde, vermelho e infravermelho próximo (podendo haver algumas variações na largura das faixas do espectro e na quantidade de bandas);
- Hiperespectrais – registram a reflectância da luz em porções muito pequenas do espectro, ou seja, particionam o espectro em faixas bem estreitas (novamente, o tamanho, a posição e a quantidade dessas bandas/faixas podem variar entre os diferentes sensores). Por isso, conseguem captar diferenças muito mais sutis nos padrões de reflectância. Geralmente são acoplados a plataformas orbitais, como os satélites, mas também podem operar a partir de veículos suborbitais. Desta forma, são capazes de capturar imagens de extensas áreas, com resolução espacial que pode variar de dezenas de metros até centímetros.
O uso de sensoriamento remoto passivo para modelagem do estoque de carbono, em sua maioria, tem se baseado em dados de resolução espacial menor (pixel ≥ 30 m). Por outro lado, poucos estudos avaliaram a utilização de dados de alta resolução para esta aplicação em florestas tropicais, especialmente, para a Mata Atlântica. Assim, a aplicação de dados ópticos dos novos e mais precisos sensores de alta resolução são uma ótima oportunidade de aprimoramento para as estimativas do estoque de carbono, e para o setor florestal como um todo. A demonstração da aplicabilidade destes dados é especialmente importante para a Mata Atlântica, por se tratar de um bioma altamente antropizado.
Tipos de variáveis
A reflectância das diferentes bandas são as principais variáveis obtidas diretamente dos sensores remotos. Entretanto, uma grande variedade de variáveis pode ser derivada dessas reflectâncias. Dentre elas, os Índices de Vegetação (IV), ou Índices Espectrais, que se baseiam na transformação das reflectâncias, por meio de equações e razões entre diferentes bandas. Esses índices podem ser capazes de evidenciar melhor a diferenciação entre os ambientes florestais. Assim, pode-se considerá-las como variáveis preditoras mais eficazes para estimar os estoques de carbono, pois exprimem melhor a complexidade de resposta espectral das florestas.
Para estimativas de carbono, os principais IVs utilizados são:
- Enhanced Vegetation Index (EVI), que utilizada as reflectâncias das bandas do azul, vermelho e infravermelho próximo;
- Normalized Difference Vegetation Index (NDVI), baseado nas reflectâncias do vermelho e infravermelho próximo, assim como o
- Soil Adjusted Vegetation Index (SAVI), sendo que este possui um fator de correção em seus cálculos.
Outras variáveis derivadas são a análise de mistura espectral, métricas de textura e matrizes de co-ocorrência no nível de cinza, por exemplo. Além disso, sensores passivos orbitais produzem séries temporais de dados ópticos capazes de evidenciar as flutuações da biomassa vegetal. Isso tem propiciado o acompanhamento permanente dos estoques florestais de carbono. Todos os aspectos elencados são fundamentais para garantir o avanço de metodologias de contabilização dos estoques de carbono. Assim como a compreensão da dinâmica deste componente em florestas secundárias, que são a maioria das formações da Mata Atlântica.
Sensores Ativos
Ao contrário dos sensores passivos, que só captam a energia refletida pela superfície terrestre, os sensores ativos registram o retorno de pulsos de energia emitidos por eles. Em síntese, pode-se utilizar diferentes tipos de energia, em que se tem como os mais frequentes a luz (isto é, frequências de ondas eletromagnéticas), ondas de rádio e micro-ondas. Além disso, a forma de leitura do retorno também é variável. Uma das principais metodologias se baseia no tempo de retorno do sinal/pulso. Este método está diretamente relacionado com a distância percorrida pelo sinal desde sua emissão, interação com o alvo e retorno ao sensor). Outro método é a determinação da degradação do sinal (medida pela diferença entre a intensidade do sinal emitido e o sinal retornado).
Uso de novas tecnologias
Nos últimos anos, a tecnologia de sensores ativos Light Detection And Ranging (LiDAR) vem sendo empregada na estimativa de carbono aéreo de florestas. Esta nova tecnologia vem conferindo ganhos notáveis à acurácia das predições, em relação aos dados de sensoriamento passivo. E por isso, vem sendo considerada por alguns pesquisadores como a melhor opção de sensoriamento remoto para este tipo de estimativa. Esta melhoria se dá porque variáveis oriundas deste tipo de sensor captam informações da estrutura florestal e da altura das árvores, derivando métricas de altura que se correlacionam fortemente com aspectos biofísicos da floresta.
Os dados de sensores ativos podem apresentar uma forte melhoria das estimativas de carbono. Entretanto, alguns estudos têm apontado que métricas LiDAR e bandas espectrais associadas podem proporcionar estimativas ainda mais precisas do estoque aéreo de carbono florestal. Os índices de vegetação também podem ser utilizados em conjunto com dados derivados de tecnologia LiDAR para tornar as estimativas mais acuradas. Assim, a integração de dados passivos e ativos (como Radar de Abertura Sintética e LiDAR) pode aumentar a acurácia da estimativa biofísica em florestas tropicais.
Os sensores ativos têm ganhado espaço em diversas áreas dos setores agrícola e florestal. Entretanto, o investimento necessário para a coleta de dados geralmente é alto, e torna o uso de LiDAR para esta finalidade uma atividade onerosa. Assim, apesar das vantagens apresentadas, sua aplicação em situações que extrapolem a escala local ainda é pouco viável economicamente. Além disso, a modelagem de carbono com sensoriamento ativo ainda não é bem estabelecida, e pouco difundida, necessitando de estudos para determinação de métodos robustos. Estes fatores, consequentemente, elevam as variáveis espectrais a um patamar de ampla aplicação na estimativa de biomassa aérea em grandes áreas.
A Relação entre os Dados de Sensoriamento Remoto e a Modelagem de Carbono
Como dito, as florestas secundárias são a maioria das formações florestais da Mata Atlântica. Conforme o avanço da sucessão, não somente o estoque de carbono aumenta, mas a estrutura da floresta também se modifica, incluindo as características do dossel. Com isso, os padrões de reflectância das florestas evoluem com seu avanço. Assim, floresta com diferentes feições estruturais, idades e estoques de carbono apresentam uma ampla gama de condições de reflectância altamente correlacionadas com estas características. A modelagem do estoque de carbono na Mata Atlântica – assim como nos demais biomas – se baseia em suas relações com essas variações.
Modelagem
Na modelagem do carbono, relaciona-se as variáveis de sensoriamento remoto com dados de inventário de amostras da vegetação, da qual se pretende estimar os estoques. O processo de modelagem pode ser realizado por diferentes técnicas, que interpretam e descrevem de diferentes formas as relações carbono-variáveis de sensoriamento remoto. Os métodos mais simples são do grupo das regressões lineares, que podem ser dividia em linear, exponencial, logarítmica, sigmoide, entre outras. Neste caso, aplica-se apenas uma variável para modelar o estoque de carbono. Quando utilizamos mais variáveis em métodos de regressão, denominamos análise multivariada, que modela o carbono a partir da influência de diferentes variáveis.
Embora as modelagens realizadas por regressão sejam mais simples, e, por isso, de baixo gasto computacional, elas têm caído em desuso. Isso tem ocorrido porque métodos de Inteligência Artificial (IA) produzem estimativas mais precisas, pois sua maior complexidade de processamento é capaz de compreender melhor as relações entre as variáveis e o estoque de carbono. Dentre as metodologias de IA mais comuns estão as Redes Neurais Artificiais, os Algoritmos de Árvore de Decisão (Random Forest, por exemplo) e Máquina de Vetores de Suporte. Essas abordagens podem ser aplicadas em diferentes contextos, apresentando desempenhos diferentes em cada situação. Desta forma, deve-se realizar a modelagem de carbono com o método que apresentar o melhor desempenho, verificando sempre a disponibilidade e o custo metodológico.
Quais as Perspectivas para o Setor?
Os avanços observados no sensoriamento remoto passivo e ativo, bem como nas metodologias de modelagem, contribuem para a compreensão do ciclo global do carbono. E isso subsidia as iniciativas internacionais de redução das emissões de gases de efeito estufa (GEE). Além disso, embasam programas das Nações Unidas como a Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal (REDD +) e o Mecanismo de Desenvolvimento Sustentável (MDS), que visa a geração de créditos de carbono.
No âmbito da Mata Atlântica, embora ainda em uma velocidade menor do que é observado para Amazônia, por exemplo, o emprego de tecnologias de sensoriamento remoto para modelar o estoque de carbono vem despontando. Então, as principais perspectivas são o desenvolvimento e solidificação de metodologias que abranjam as diferenças fitofisionômicas do bioma; sobretudo, aquelas baseadas em sensores ativos. Além disso, espera-se uma ascensão das metodologias de modelagem baseadas em dados ópticos. Tal fato possibilitaria que as estimativas de carbono florestal fossem realizadas em nível de paisagem, embasando as iniciativas internacionais citadas.
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