Um dos grandes desafios da agropecuária é manter a produção de alimentos, biocombustíveis e madeira em níveis que sustentem uma população em contínuo crescimento, sem com isso, aumentar a degradação do meio ambiente. Neste contexto, temos os sistemas de Integração Lavoura-Pecuária-Floresta (ILPF), como importante estratégia para diversificação de empreendimentos agropecuários.
Vejamos neste texto como são constituídos os sistemas ILPF, de que maneira eles permitem maior eficiência de uso dos recursos disponíveis, contribuindo para reduzir a degradação ambiental e aumentar a lucratividade dos produtores rurais.
O que é uma ILPF?
A integração lavoura-pecuária-floresta é definida como uma estratégia de produção agropecuária que integra os diferentes sistemas produtivos – agrícolas, pecuários e florestais -, dentro de uma mesma área. A ILPF pode ser realizada em cultivo consorciado, em rotação ou sucessão, de forma que haja interação entre os componentes, gerando benefícios mútuos.
Além disso, a ILPF pode ser adotada de diferentes formas, havendo possibilidade de se utilizar inúmeras culturas e diversas espécies animais, adequando-se às características regionais, às condições climáticas, ao mercado local e ao perfil do produtor.
Visando aumentar a eficiência de utilização dos recursos naturais e a preservação do ambiente, resultando no incremento da produção e na estabilidade do produtor rural, temos que a ILPF pode ser adotada por pequenos, médios e grandes produtores.
Atualmente, os sistemas são classificados em quatro modalidades:
- Integração Lavoura-Pecuária (ILP) ou Agropastoril: sistema de produção que integra o componente agrícola e pecuário em rotação, consórcio ou sucessão, na mesma área e em um mesmo ano agrícola ou por vários anos, em sequência ou intercalados;
- Integração Pecuária-Floresta (IPF) ou Silvipastoril: sistema de produção que integra o componente pecuário (pastagem ou animal) e florestal, em consórcio;
- Integração Lavoura-Floresta (ILF) ou Silviagrícola: sistema de produção que integra o componente florestal e agrícola pela consorciação de espécies arbóreas com cultivos agrícolas anuais ou perenes;
- Integração Lavoura-Pecuária-Floresta (ILPF) ou Agrossilvipastoril: sistema de produção que integra os componentes agrícolas e pecuário em rotação, consórcio ou sucessão, incluindo também o componente florestal.
Vantagens da ILPF
Com área ocupada de cerca de 15 milhões de hectares no Brasil, segundo o Censo Agropecuário 2017 do IBGE, os diferentes sistemas de ILPF favorecem diversas estratégias produtivas, entre elas a pecuária leiteira e a produção de madeira.
Os benefícios da ILPF já são bastante conhecidos por todos. Contudo, há uma constante evolução, sobretudo, na aquisição de novos dados que ajudam na tomada de decisão e na difusão dessa tecnologia, contudo, como principal vantagem, temos que os sistemas ILPF contribuem para ampliar as entradas de recursos financeiros junto aos produtores, mantendo um fluxo de caixa mais constante durante os diferentes ciclos produtivos.
Estudos desenvolvidos por diferentes unidades da Embrapa e outras instituições revelam que a ILP proporciona ganhos múltiplos e aumenta a lucratividade, visto que esses sistemas utilizam melhor os insumos, aumentam a quantidade de carbono no solo, melhoram a produtividade, produzem mais alimentos com menor emissão de gases de efeito estufa, reduzem os riscos e são mais resilientes às mudanças do clima.
A introdução do componente florestal nestes sistemas é uma importante estratégia para o aumento da renda futura decorrente da venda dos produtos madeireiros e não-madeireiros e dos benefícios que traz ao meio ambiente, devendo se dar preferência na escolha espécies de crescimento rápido e que produzem madeira para usos múltiplos. Associar o componente arbóreo às pastagens e às lavouras em regiões com pecuária de baixo nível tecnológico e com pressão para abertura de novas áreas, como a região Norte do país, é uma excelente alternativa ao desmatamento.
Principais obstáculos na adoção dos sistemas ILPF
Alguns são os obstáculos que os produtores enfrentam para que os sistemas ILPF sejam adotados em suas propriedades. O primeiro diz respeito ao maior investimento inicial, embora se saiba que os sistemas de ILPF proporcionam retorno financeiro mais rapidamente (a partir do quarto ano) quando comparados às produções contínuas de soja e milho (seis anos) ou à pecuária de corte (cinco anos).
Outros desafios para adoção dos sistemas ILPF são principalmente a falta de mão de obra capacitada para a lavoura e pecuária, dificuldade de acesso a crédito, problemas estruturais de logística e obstáculos ligados ao mercado estão entre as principais causas relatadas por produtores rurais e profissionais ligados às cadeias produtivas.
Entre os principais desafios para a consolidação da ILPF em localidades amazônicas destacam-se as pendências em relação à regularização fundiária e ambiental das propriedades rurais – aspecto que limita o acesso a linhas de crédito rural – a ausência de assistência técnica continuada, os elevados preços dos produtos agropecuários e problemas na logística da produção, o alto investimento inicial necessário para a aquisição de máquinas e implementos agrícolas e a falta de informação sobre esses sistemas.
Outro ponto relevante é a questão cultural. Muitos produtores, principalmente os pecuaristas, preferem permanecer em uma única atividade e não assumir o risco de novos financiamentos para iniciar uma atividade.
Uso de espécies nativas
É sempre bom dizer que cada bioma, cada região, cada fazenda e cada produtor têm suas necessidades particulares e cabe buscar uma boa orientação técnica, a fim de diminuir os riscos de investimentos inadequados.
O mais comum é a implantação de clones de eucalipto, com o objetivo inicial de sombreamento, com possibilidade de desbastes que irão ser propícios para a produção de mourões de cercas, porém o uso de espécies arbóreas nativas em sistemas ILPF mostra-se muito interessante.
Entretanto, a integração Lavoura-Pecuária-Floresta (ILPF ou agrossilvipastoril) e a integração Pecuária-Floresta (IPF ou silvipastoril) com componente arbóreo nativo ainda são bastante tímidas no país. A Amazônia trabalha com nativas há muito tempo e de uma forma consistente, porém na região Sudeste utiliza-se principalmente o eucalipto em integração, assim como em outras regiões.
O uso de espécies nativas em sistemas de integração agropecuários, além de agregar valor com a diversificação de produtos florestais de qualidade, é uma alternativa para produzir alimentos de forma mais equilibrada com o meio ambiente, ao promover serviços importantes para o ambiente, que se reflete em melhorias para o solo e para a conservação da água, por meio do aumento de matéria orgânica na área, da atividade microbiológica e da ciclagem de nutrientes, podendo assim promover alterações na fertilidade e a maior infiltração e retenção de água no solo.
O componente arbóreo também regula o microclima, favorecendo ao bem-estar animal, com reflexos na produção de carne e leite. A pastagem com as árvores aumenta também a diversidade de fauna, auxiliando no controle de pragas e de doenças. Se o produtor optar trocar o eucalipto por espécies florestais nativas, o aumento da biodiversidade no sistema e o potencial de recuperar serviços ambientais é mais significativo ainda. O indicado é o produtor ter uma combinação de árvores de acordo com a finalidade do sistema. Outra vantagem é a econômica, pois geralmente, a madeira dessas espécies tem mais qualidade, por isso o retorno financeiro é melhor.
Porém, uma desvantagem de algumas espécies nativas é a lentidão no crescimento, o que exige em alguns casos de sistemas com pecuária que as mudas sejam protegidas com cerca, para evitar danos causados pelo gado. Já o mogno brasileiro e o cedro, por exemplo, enfrentam problemas com pragas, como a broca do ponteiro (Hypsypyla grandella), que inviabilizam a utilização nos sistemas ILPF.
Algumas espécies frutíferas também têm se mostrado viáveis, principalmente para pequenos agricultores. Exemplos bem-sucedidos com o uso de pequizeiro, coqueiro, baru, gabiroba, goiabeira e cajueiro mostram a versatilidade dos sistemas ILPF.
Fatores que podem aumentar uso da ILPF
Como principais aspectos, observando as principais dificuldades dos produtores rurais, temos que alguns fatores poderão aumentar ainda mais a área de ILPF no Brasil.
Entre os fatores temos a regularização da situação fundiária de um grande número de propriedades rurais, a disponibilidade de crédito mais barato, com maior carência e segurado, aumento no número de Unidades de Referência Tecnológica com ILP e ILPF, capacitação de extensionistas para ampliar os serviços de assistência técnica no campo, melhoria na infraestrutura de estradas rurais e silos, melhor acesso a maquinários e silos públicos, modernização das cadeias de valor, com recompensas aos produtores pela produção sustentável, e fornecimento de incentivos por meio do pagamento por serviços ecossistêmicos e estímulo à mudança de cultura.
Desde que o Brasil assumiu o compromisso de reduzir as emissões de gases de efeito estufa durante a Conferência de Mudança do Clima, em 2009, vêm sendo adotadas várias estratégias de mitigação, entre elas, a implantação de ILP/ILPF.
O desenho das instituições para que o Brasil alcance suas metas baseou-se em três pilares: pesquisa, capacitação e financiamento. Trabalhos científicos com foco em sistemas integrados têm gerado informações técnicas, econômicas e ambientais que dão suporte e confiança para o produtor investir nesses modelos. Trata-se de um trabalho a longo prazo, mas que trará grandes resultados econômicos e ambientais para todos.
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