A plasticidade fenotípica, por definição, é a capacidade de um genótipo de mudar sua fisiologia e morfologia para se adequar às variações ambientais, permitindo que uma espécie com um mesmo perfil genético possa se desenvolver em uma ampla gama de condições. Especificamente, a plasticidade fenotípica relacionada às variações do aspecto dos órgãos vegetais pode ser chamada de plasticidade morfológica. Essas variações morfológicas se originam da interação da capacidade genética de adequação ambiental com as condições locais. Mas, qual a importância da plasticidade fenotípica? Em suma, plasticidade fenotípica trata-se de um mecanismo que, principalmente, organismos sésseis, como as plantas, utilizam para resistirem ao estresse ambiental.
Mas, por que este fenômeno acontece?
O fenômeno ocorre porque as plantas desenvolveram processos evolutivos e ecológicos específicos para enfrentar as variações ambientais e heterogeneidade espacial. Assim, a evolução desses organismos está intimamente relacionada ao ambiente onde crescem. Entretanto, não existe um consenso se a plasticidade fenotípica promove a evolução, ou se é com a evolução que as espécies se tornam mais plásticas.
Essas relações entre plantas e organismos circundantes, e o ambiente, afetam diretamente as configurações demográficas das populações vegetais. Consequentemente, estes eventos modificam a estrutura da comunidade e afetam o equilíbrio de todo o ecossistema. Em síntese, estes fenômenos são os propulsores de todas as mudanças ecológicas em escala de população ou de paisagem. Então, essa rede de interações se torna tão complexa que é capaz de direcionar as mudanças genéticas, promovendo a diferenciação de espécies, e em última análise possibilita a plasticidade fenotípica para adaptação ambiental.
Diversos fatores ambientais podem alterar, em diferentes intensidades, a morfologia das espécies. Os fatores mais comuns são relacionados à disponibilidade de luz e ao déficit ou saturação hídrica. Entretanto, fatores como textura, fertilidade e toxidez do solo, temperatura, umidade do ar e ocorrência de ventos constantes também podem ser impulsionadores de plasticidade fenotípica.
Muitos aspectos da plasticidade fenotípica são importantes para o setor florestal. Vejamos como esse fenômeno se relaciona com alguns fatores:
Importância para as espécies vegetais
A plasticidade fenotípica ocorre principalmente em órgãos vegetativos, como as folhas. Em geral, o tamanho e formato são as características que mais se modificam, mas a cor e indumentação também podem se alterar. Por exemplo, quando uma planta se desenvolve sob condições de baixa luminosidade suas folhas tendem a serem maiores e mais delgadas. Tal fato ocorre para que o vegetal possa otimizar a captação de luz. Com isso, garante-se um maior desempenho fotossintético, mantendo as funções fisiológicas e, consequentemente, o crescimento e alocação de carbono.
Portanto, se uma espécie apresenta grandes variações de alocação de carbono em relação à disponibilidade de luz, indica uma alta capacidade de aclimatação. Em outras palavras, a plasticidade fenotípica está atendendo sua premissa de manter os padrões saudáveis de crescimento vegetal, mesmo em condições ambientais variáveis.
Diferenciação de espécies
Inicialmente, agrupavam-se as plantas por meio de sistemas de classificação “artificiais”. Estes eram assim chamados por se baseavam apenas no hábito das plantas. Por exemplo, as árvores e as lianas eram grupos distintos, desconsiderando as características genéticas e reprodutivas. Com o avanço da ciência, desenvolveram-se novas formas de classificar. Sistemas que consideravam os aspectos morfológicos, sobretudo dos órgãos reprodutivos, começaram a ser amplamente empregados para classificação das espécies.
No entanto, estes sistemas, por se basearem apenas nos aspectos morfológicos das plantas, acabavam por negligenciar semelhanças ou diferenças do ponto de vista filogenético. Assim, com o rápido desenvolvimento das ciências ômicas (genômica, transcriptômica, proteômica, metabolômica e análise multi-ômica) e dos métodos estatísticos no século 21, uma melhor compreensão dos padrões genéticos das populações vegetais se viabilizou. Por exemplo, métodos cladísticas, como a Análise de Parcimônia e Máxima Verossimilhança, usados para determinar o grau de parentesco entre diferentes linhagens genéticas. Tais metodologias nos permite entender os mecanismos adaptativos relacionados às interações intra e interespecífica, e com o ambiente.
Em suma, a delimitação precisa e consistente de espécies em clados morfologicamente homogêneos depende de estudos filogenéticos mais aprofundados. Além disso, a pesquisa das interações espaço-temporais e ecológico-evolutivas são fundamentais para a compreensão da adaptação das plantas de uma perspectiva molecular à escala ambiental.
Identificação de espécies
Como entendemos acima, a plasticidade fenotípica é um processo importante para a sobrevivência e desenvolvimento das plantas. No entanto, dificulta o processo de diferenciação das espécies com base em caracteres morfológicos, principalmente os vegetativos. Mas então, como realizar a identificação das espécies de forma correta em campo? Bem, existem alguns pontos que podem ser abordados para que a determinação da espécie seja mais segura.
Conhecer os grupos de espécies
A experiência como Engenheiro Florestal ou, mais especificamente, como dendrólogo/identificador florestal faz com que o profissional conheça as principais espécies e ou grupo de espécies de sua região de atuação. Assim, é possível saber quais delas tendem a apresentar maior variação dos caracteres morfológicos, facilitando o reconhecimento de indivíduos que possam parecer “diferentes”. Neste caso, a avaliação deve ser muito criteriosa. Indivíduos morfologicamente distintos, mas que pertencem a grupos pouco plásticos, devem ser comparados com outras espécies possíveis, ocorrentes na região. Já, quando a planta é diferente, mas morfologicamente próxima a grupos muito plásticos, pode-se presumir que se trata de uma mesma espécie, e uma breve verificação pode ser o suficiente para confirmar a identificação do indivíduo.
Variações morfológicas relacionadas à idade
Ainda a respeito de conhecer as espécies, uma questão importante é conhecer quais espécies ou grupo de espécies apresentam plasticidade morfológica ao longo de seu desenvolvimento. Muitas espécies apresentam variações significativas entre as plantas jovens e adultas. As variações ocorrem principalmente na folha. Por exemplo, Roupala montana Aubl. (Proteaceae) apresenta folhas compostas pinadas quando jovens, evoluindo gradativamente para folhas simples na planta adulta, havendo momentos em que uma mesma planta pode apresentar os dois tipos. Além disso, algumas espécies podem apresentar variações de hábito. Espécies do gênero Machaerium Pers. (Fabaceae) podem apresentar indivíduos arbóreos e com hábito lianescente na mesma área. Isso demonstra que as condições ambientais que determinam a plasticidade fenotípica são muito sutis, pois as variações ocorrem mesmo em condições muito semelhantes.
Guardar proporções
Muitas plasticidades se apresentam na variação das dimensões dos órgãos. Por exemplo, muitas espécies do gênero Inga Mill. (Fabaceae) apresentam folhas de tamanho diferentes quando se desenvolvem à sombra ou a pleno sol. Ao contrário, Platypodium elegans Vogel (Fabaceae), uma espécie de ampla ocorrência, geralmente mantém suas características foliares, mas varia a espessura da sua casca externa em indivíduos do Cerrado e da Mata Atlântica. Uma forma de se superar essa dificuldade no momento da identificação é observar as proporções dos órgãos. Quando uma folha cresce mais ou menos, de forma saudável, em função da disponibilidade luminosa, todas as suas partes se desenvolvem na mesma proporção. Assim, se uma espécie apresenta um pecíolo de 2 cm e uma folha de 5 cm de comprimento do limbo, quando ela se desenvolver em condições de sombreamento ela poderá atingir 4 cm de pecíolo e 10 cm de limbo, por exemplo.
Coleções de herbários
Atualmente boa parte das coleções dos herbários estão disponíveis em versões virtuais, com fotografias de ótima qualidade em diferentes portais. As plataformas JABOT e Species Link são exemplos de alternativas de verificação do material botânico, quando o acesso aos herbários físicos é reduzido. Obviamente as percepções das observações virtuais são mais limitadas, mas, com a evolução da experiência profissional, essas ferramentas serão cada dia mais úteis no trabalho do dendrólogo. Sejam físicas ou virtuais, o fato é que, coleções de herbário reúnem plantas de uma mesma espécie oriundas de uma variedade de locais e condições ambientais. Com isso, é possível observar boa parte do espectro fenotípico que determinada espécie pode apresentar em condições ambientais, facilitando o reconhecimento quando observada em campo.
Caracteres pouco plásticos
Na dendrologia, as folhas costumam ser os órgãos mais utilizados na identificação de espécies. Em contrapartida, geralmente são os órgãos que mais se modificam em resposta às variações ambientais. Portanto, em muitos casos, as dicas anteriores podem se tornar limitadas. Assim, o profissional de identificação deve se atentar a outras características. Por exemplo, padrões de casca interna e exsudação costumam se modificar menos nos diferentes ambientes. Além disso, caracteres mais especiais como acúleos, espinhos, cicatrizes peciolares, lenticelas e domácias costumam ser morfologicamente mais consistentes em relação à variação plástica de outros órgãos.
Cultivos florestais
Do ponto de vista do melhoramento genético e cultivo florestais, pode-se aplicar a plasticidade fenotípica na seleção de materiais genéticos mais adaptativos às condições ambientais. A exemplo, tem se utilizado as comparações de índices de plasticidade de distância relativa como indicadores da capacidade de certas espécies ou genótipos de tolerar variações de fatores físicos do ambiente, como água, luz, nutrientes e temperatura.
Embora esses índices sejam bons indicadores de adaptação ambiental dos genótipos, a interpretação biológica da plasticidade fenotípica é complexa. Por exemplo, grandes variações de crescimento em resposta a gradientes ambientais podem indicar uma baixa capacidade de aclimatação. Este fenômeno significa que o crescimento da planta é anômalo e não atende as adequações morfológicas e fisiológicas para manter seu desenvolvimento.
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