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Serviços Ecossistêmicos de Solo e Água em Sistemas Silvipastoris Autóctones 

Em 18 de julho de 2025

O sistema Solo-Água são altamente interdependentes em qualquer paisagem natural. Em sistemas de produção agrícola e pecuária, há a diminuição da complexidade de interações entre os componentes (em comparação à um sistema de referência, como uma floresta). Isso exige que as relações restantes sejam ainda mais coesas, a fim de garantir a estabilidade e funcionamento dos componentes a longo prazo.

A seguir, algumas das principais funções e relações dos fatores edáfico e hídrico são melhores abordadas no contexto dos Serviços Ecossitêmicos.

Solo

As condições edáficas e os componentes vegetais se relacionam estreitamente em paisagens manejadas pelo homem. Por exemplo, pastagens com solos degradados experimentam uma perda acentuada de diversidade vegetal. Entretanto, o efeito inverso, de influência da vegetação na conservação do solo, é um fator primordial para a recuperação ambiental e produtiva de sistemas de pastoreio degradados. Por exemplo, as árvores são capazes de melhorar a disponibilidade hídrica nas camadas mais superficiais do solo (0-30 cm), mas a longo prazo podem ressecar o solo abaixo dessas camadas.

Microbiologia

Raízes de espécies arbóreas podem sofrer diferentes tipos de colonização fúngica, que tendem a variar conforme a idade das árvores. O manejo da paisagem influencia profundamente na diversidade e funcionamento dessa comunidade microbiana. Usos menos intensivos do solo, como os SSP, promovem a diversificação de microrganismos e as respectivas atividades ecossistêmicas. Esses organismos do solo atuam na autorregulação dos ecossistemas em geral. Por isso, esses organismos desempenham um papel fundamental na prestação de Serviços Ecossistêmicos e, por isso, a avaliação do solo deve considerá-los.

O aumento da diversidade funcional microbiana impulsiona a atividade enzimática relacionada à decomposição da matéria orgânica. Esse processo promove uma maior disponibilização de nutrientes para as plantas, conforme verificado em solos úmidos de agroflorestas no semiárido brasileiro. Contrariamente, a diminuição na diversidade de fungos micorrízicos provocada por usos intensivos reduz a eficácia dessa comunidade em realizar seus processos de degradação da matéria orgânica. Portanto, influenciando negativamente a disponibilidade de nutrientes para as plantas.

Pesquisadores comumente utilizam a avaliação da diversidade e biomassa microbiana, atividade enzimática e metabolismo, proteínas do solo, taxa de decomposição da matéria orgânica e carbono orgânico do solo para abordar o fornecimento de Serviços Ecossistêmicos relacionados aos microrganismos edáficos. Além disso, a abundância, diversidade e estrutura da colonização micorrízica podem ser critérios para verificar a atividade microbiana no solo. Adicionalmente, podemos utilizar métricas de colonização micorrízica, como densidade e diversidade de esporos, taxa de colonização arbuscular e razão arbúsculo-vesícula nas raízes das espécies forrageiras, para medir a atividade microbiana. Finalmente, podemos usar as taxas de transferência de nutrientes entre as espécies para avaliar o fornecimento de Serviços Ecossistêmicos associados.

Fixação Biológica de Nitrogênio

Microrganismos relacionados às árvores contribuem para estruturar o solo, mantendo-o saudável e capaz de sustentar suas funções socioecológicas, como apontado no tópico anterior. Entretanto, embora a fixação biológica de nitrogênio (FBN) seja uma dessas contribuições, sua ocorrência não depende apenas da ação microbiana. Esse fenômeno ocorre pela associação simbiótica de diversas espécies arbóreas com espécies de bactérias. Trata-se de uma interação essencialmente importante para a saúde e fertilidade do solo. Em sistemas altamente antropizados e nutricionalmente esgotados pelo uso agropecuário ou naturalmente pouco férteis a contribuição dessa interação é ainda mais importante.

Espécies leguminosas (Fabaceae) são comumente conhecidas por realizar essa associação. Portanto, o cultivo dessas plantas em em sistemas agropecuários de arranjo mistos é comum, a fim de melhorar a disponibilidade de N no solo. Com isso há um impulsionamento na produtividade das culturas associadas, sobretudo sob as copas e suas imediações. Leguminosas herbáceas também podem realizar FBN e, por isso, indicadas para semeadura em pastagens, a fim de maximizar a disponibilidade de N e melhorar a produtividade da forragem.

É importante salientar que a implantação de espécies arbóreas exóticas invasoras fixadoras de nitrogênio pode acarretar prejuízos. Isso porque, pelo excesso de fixação, este nutriente pode provocar poluição, sobretudo em paisagens fertilizadas. Além das variáveis elencadas para verificar a atividade microbiana no solo e no sistema radicular arbóreo, podemos utilizar o teor de N e métricas de diversidade e densidade de bactérias fixadoras de nitrogênio formadoras de nódulo. Essas métricas podem ser usadas para aferir a intensidade do fornecimento desse Serviço Ecossistêmico.

Fertilidade

Parte do que torna um solo adequado para o cultivo de culturas agrícolas e pastagens é sua fertilidade. Trata-se da capacidade de fornecimento de nutrientes do solo. Essa capacidade é depende da composição da MOS e dos seus processos de decomposição e mineralização, mantidos pela ação de bactérias, fungos e fauna microbívora. Como destacado anteriormente, a vegetação interage com o componente microbiológico do solo, podendo aumentar a sua diversidade e FBN, impulsionadores essenciais da fertilidade do solo.

Neste contexto, boas práticas de manejo da forragem e do solo das pastagens podem manter a qualidade físico-química do solo. A presença de árvores nessas paisagens favorece a preservação desses processos e dos padrões de qualidade edáfica. Portando, melhorão a manutenção do ciclo dos nutrientes e a disponibilidade deles no solo. Além da interação microbiológica, diferentes espécies de árvores impulsionam em diferentes intensidades a produção de serrapilheira e a ciclagem de nutrientes. Assim, a diversidade de plantas nativas e altas taxas de ocupação por espécies invasorasestes impactam esses processos.

A utilização de diversas metodologias podem medir a fertilidade do solo. Alguns estudos abordaram a concentração de determinados nutrientes no solo. Entre os elementos químicos fósforo (P), potássio (K), cálcio (Ca) e magnésio (Mg) são comumente avaliados como indicadores de fertilidade do solo. Entretanto, a avaliação de C e N pode ser empregada com sucesso para verificar a disponibilidade de outros nutrientes. Isso ocorre porque há uma grande relação destes elementos com MOS e FBN, e, portanto, são capazes de modular a fertilidade do solo.

Observando essas relações, estudos constataram melhorias nos teores de MOS e bases trocáveis (K+) em Sistemas Silvipastoris Autóctones com espécies nativas e áreas de agricultura com diferentes níveis de produtividade e degradação por cultivo mecanizado no continente africano. Outros estudos também utilizaram parâmetros de capacidade de troca de cátions (CTC) como um indicador de fertilidade para SSP.

Controle da erosão

A cobertura vegetal de pastagens diminui a perda de solo pela ação dos diferentes agentes de erosão, sobretudo erosão hídrica e eólica. Tanto pastagens quanto florestas, comumente são sistemas de alta performance na conservação de propriedades edáficas relacionadas à redução da erosão, como a formação de macroagregados, densidade e porosidade do solo. Portanto, embora as pastagens bem manejadas sejam capazes de controlar processos erosivos, a presença de árvores nesses sistemas de produção agropecuária integrada pode maximizar a estabilidade do solo.

Como a vegetação age na estabilização do solo, estudos apontam que pastagens com sistemas de manejo menos intensivos e com alta diversidade podem ofertar maiores serviços de controle de erosão. O controle da erosão em sistemas de pastoreio é essencial, pois a influência dos detritos erosivos vai além da área erodida. Esses detritos promovem a sedimentação dos corpos hídricos, reduzindo a oferta quali-quantitativa de Serviços Ecossistêmicos de provisão, regulação e culturais relacionados à água.

Podemos utilizar diversas métricas para quantificar a erosão e os respectivos processos de controle em solos de pastagens. Comumente, variáveis como a estabilidade dos macros e microagregados, densidade aparente, porosidade e tamanho dos poros, e a MOS podem ser utilizadas para medir a estabilidade do solo e sua respectiva propensão à erosão. Portanto, podemos empregar essas variáveis para verificar o ganho no controle de erosão em diferentes sistemas de produção consorciados com árvores.

Recursos hídricos

As áreas de pastagens e seus sistemas híbridos, como os Sistemas Silvipastoris Autóctones, podem ser formadas por um conjunto de zonas úmidas em torno de diferentes tipos de recursos hídricos (rios, lagos, nascentes e áreas pantanosas, por exemplo). Esses são as maiores fontes de água para irrigação e dessedentação animal. Portanto, a manutenção da qualidade desses corpos hídricos é fundamental para a manutenção das espécies de forragem e a produção pecuária.

Escoamento Superfial e Infiltração

O escoamento superficial em pastagens é consideravelmente menor do que em paisagens agrícolas e urbanas. Em contra partida, a retenção de água na camada superficial do solo pode ser equivalente ao de florestas e relativamente maior do que em áreas agrícolas. Nesses ecossistemas, a vegetação regula os padrões espaço-temporais de escoamento superficial da água precipitada.

Isso resulta no controle de inundações e recarga dos aquíferos. Portanto, componente vegetal das pastagens controlam os padrões quali-quantitativos das águas superficiais e subterrâneas. As árvores funcionam como catalizadores de água, pois melhoram as propriedades do solo (apresentadas anteriormente), aumentando a infiltração e reabastecimento dos aquíferos subterrâneos. Assim, a condução de sistemas mistos de pastagens e árvores pode favorecer a redução do escoamento superficial e melhor infiltração.

Além da qualidade do componente vegetal, a produção total de água nas pastagens depende de outros fatores. Dentre elas, as variáveis climáticas, como a quantidade e o padrão das chuvas e clima regional, e topográficas. Atividades antropogênicas excessivas podem afetar significativamente essas variáveis, que por sua vez, impactam de diferetnes formas e intensidades os recursos hídricos. Assim, pastagens sob sistemas de manejo menos intensos tendem a apresentar melhores condições de armazenamento de água. Além disso, o manejo e qualidade do solo são determinantes para regular o volume e qualidade da água produzida nessas paisagens.

Atividades antropogênicas excessivas podem afetar significativamente essas variáveis, impactando os recursos hídricos de diferentes formas e intensidades.

Avaliação de Serviços Ecosistêmicos Hídricos

O impacto positivo de árvores na regulação hídrica é comumente subutilizado em estudos de provisão de Serviços Ecossistêmicos, em detrimento de outros parâmetros de qualidade ambiental. Entretanto, a maioria das avaliações desse Serviço Ecossistêmico considera a produção e o escoamento superficial para determinar o abastecimento de água doce. Essas avaliações são realizadas com base em dados locais de precipitação, evapotranspiração e infiltração do solo. Podemos avaliar a infiltração por meio de variáveis como taxa de infiltração, porosidade e quantidade de buracos de minhoca.

A aplicação de variáveis relacionadas ao ciclo hidrológico no solo em modelos de estimativas de Serviços Ecossistêmicos podem fornecer estimativas de produção de água em escalas sub-bacias hidrográficas. Além disso, a utilização de modelos de análise de expansão de terras pode estimar a disponibilidade futura de água para diferentes cenários de uso da terra, fornecendo medidas de mudança de uso e de volumetria de água conservada ou fornecida.

Além do controle da quantidade de água produzida, as pastagens e o componente arbóreo associado promovem uma regulação qualitativa dessa produção. Um estudo em Sistema Silvipastoris detectou uma rápida melhoria em variáveis como turbidez e demanda biológica de oxigênio (DBO), além do aumento da riqueza e densidade de invertebrados, que demonstra a redução na poluição de cursos d’água. Isso ocorre, porque a vegetação desses ecossistemas controla a geração, quantidade, os processos de migração e a toxicidade dos poluentes, e por isso podem melhorar a qualidade da água. Neste contexto, modelos de retenção de nutrientes para purificação de água tem sido frequentemente utilizado para avaliar este serviço.

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Autor(a)

Técnico Florestal pelo Instituto Federal de Rondônia e Engenheiro Florestal pelo Instituto Federal de Mato Grosso. Desde o início de sua carreira sempre apresentou entusiasmo pela parte de taxonomia, botânica e dendrologia. Durante a graduação conduziu estudos sobre a vegetação de Cerradão na Região de Cáceres – MT, onde atuou como consultor em botânica e dendrologia, colaborando na elaboração de laudos fitossociológicos. Participou de inventários florestais para pesquisas no Cerrado, trabalhando principalmente com estrutura de comunidades arbóreas. Mestre em Ciência Florestal pela Universidade Federal de Viçosa, onde atualmente é doutorando, com concentração na área de Manejo Florestal, desenvolvendo sua pesquisa sobre a distribuição e modelagem do estoque de carbono em florestas secundárias da Mata Atlântica na Zona da Mata Mineira.
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